sábado, 8 de dezembro de 2007

Godiva




















Ela é ímpar. Nasceu em berço de ouro e carrega nos ombros a responsabilidade de continuar o império da família, tarefa que não escolheria se lhe fosse permitida essa opção.
Demasiado rebelde, espírito livre, quase selvagem. Ama a natureza e por ela luta desesperadamente.

Segue a galope no seu cavalo negro e brilhante, por entre as plantações de café, certificando-se de que as regras estão a ser cumpridas.

Cabelos soltos ao vento, calça de ganga justa, camisola de manga comprida com atilhos desapertados à frente revelando os seios livres que galopam ao ritmo do cavalo. Imagina-se uma cowgirl do oeste, uma Robin dos Bosques de Sherwood, uma Amazona justiceira e feroz.

Não tem homem, embora todos lhes caiam aos pés, ela só tem olhos para o Trovão. Quem é que precisa de homem quando tem à sua disposição um puro-sangue daqueles?
O cavalo é um belo animal, inteligente e sensível. Os dois entendem-se na perfeição.

O Trovão é um garanhão. Ela observa-o a cobrir a égua com toda a sua força pujante transformada em mestria instintiva. Observa todos os músculos, todos os movimentos, a rendição e gozo da égua e não deixa de ter uma ponta de inveja do casal.
Equilíbrio, elegância, força e delicadeza. O macho perfeito. Suspira.

Estão a cavalgar os dois, a uma velocidade louca. O Trovão avança pelo prado mais rápido que um relâmpago. O ritmo é repentinamente quebrado e ela é lançada para a frente, rasgando o solo com o seu corpo. É no que dá quando não se usam estribos. Ferimentos graves, clavícula partida. O cavalo magoou-se gravemente numa pata dianteira. O veterinário queria abatê-lo, mas ela não deixa. Contrata a melhor cirurgiã especialista neste tipo de lesões e consegue recuperar o cavalo.

As mazelas físicas de ambos demoram o mesmo tempo a cicatrizar. O cavalo recupera totalmente, mas não a deixa montar. Deixa montar qualquer um, menos a ela. Magoada e frustrada, acaricia o bicho, passa horas a falar com ele, a dizer-lhe que ele não teve culpa, mas ele mostra-se inflexível, já não é o mesmo.

Então ouve finalmente falar de um sujeito que faz milagres com os cavalos, que os entende como ninguém. Contrata-o. Ele leva o cavalo para uma clínica distante à beira-mar. Ele é diferente, não lhe cai aos pés, não se rende à sua beleza. Isso desafia-a. Ela tenta desesperadamente conseguir a sua atenção, mas ele só atenta no cavalo, concentrado e profissional. Ele toca no cavalo como ela gostaria de ser tocada, com suavidade e firmeza, e o cavalo obedece. Juntos dão longos passeios pela areia molhada, ela começa a ter uma certa inveja da relação deles, o cavalo afeiçoa-se ao mestre, ela sente que é ali que ele pertence.

Vão mais uma vez passear na praia, ela a pé, ele montado no cavalo. Ele acha que o animal já está preparado e convida-a a subir para junto dele. O Trovão não se mexe. Ela deixa-se envolver pelo corpo do homem e sabe-lhe bem, sente-se perfeitamente segura e em harmonia. O cavalo tranquiliza-se. O mestre pede-lhe para avançar sem medo e o Trovão dá os primeiros passos nervosos. Ela não cabe em si de excitação! Abraça o pescoço do cavalo, sussurra-lhe à orelha "lindo menino, assim mesmo é que é!" O mestre sorri, mas ela não vê aquele sorriso misto de missão cumprida e desejo. Agora já pode ceder à conquista dela. Segura-a firme e ajuda-a a voltar-se para ele. Ela agradeceu-lhe com um abraço que não deixou espaço para palavras nem dúvidas. Seguiu-se o beijo deliciosamente longo e profundo, há muito aguardado pelos três.

O Trovão juntou-os, e continua a juntá-los. Dão longos passeios na areia molhada da praia deserta, ao sabor da maresia, e fazem amor ao ritmo quente do galope.


inspirado na lenda de Lady Godiva e no livro "O Encantador de Cavalos" de Nicholas Evans
foto: CORBIS

4 comentários:

Pekenina disse...

Sonho. Nitidamente uma história de sonho. Tão boa, tão sentida, tão fantasiada. Amante de animais como sou esta história toca-me particularmente. E os laços entre a dona e o cavalo é algo que apenas verdadeiros amante entendem. É bom saber que existe alguém que nos entende. No fundo conseguiu encontrar a felicidade a 3, unidos por um objectivo comum. Parabéns pelo enredo =)
Beijo galopente,
Pekenina*

Gata Verde disse...

Interessante a parte do galope!

Beijinhos e bom fds

Alguém Comum disse...

Que galope...

bj discretamente galopante

Pedro disse...

O rapaz pelos vistos não entendia só de cavalos!
Conseguiu domar mais qualquer coisa!
Boa história, sem dúvida.

PedroC